quinta-feira, 4 de março de 2010

OS JUÍZES ACIMA DO DIREITO

No último dia 28/02 foi publicada na imprensa a decisão do Conselho Nacional de Justiça referente ao caso dos Desembargadores do Tribunal de Justiça do Mato Grosso – incluindo-se o presidente – acusados de desvio de cerca de R$ 1,5 mi de verbas do Tribunal para cobrir rombo de uma loja maçônica local. A “pena” aplicada foi de aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais em vez do tradicional benefício integral.
Todos temos a noção, que vem desde a infância, de que para cada erro há uma punição correspondente. A sanção, todavia, sempre deve ser proporcional à ofensa cometida. Trata-se de princípio básico do Direito, chamado de princípio da proporcionalidade.
Desde os primórdios a sociedade sempre se preocupou em estabelecer a proporcionalidade da pena, de acordo com o seu nível de evolução. Tal já se via no monólito que contém o Código de Hamurabi (1700 a. c.), no qual havia duzentos e oitenta e um artigos de lei, entre eles a conhecida lex talionis, ou, lei de talião, que previa a aplicação de penas mais ou menos graves de acordo com o delito praticado.
No Antigo Testamento, mais especificamente nos livros do Pentateuco (cinco primeiros livros da Bíblia), que contam a história da saída do povo judeu do Egito e sua saga em busca de terra prometida, Moisés, sob a inspiração Divina, estabeleceu diversas penas para várias situações, entre as quais os crimes de homicídio, roubo, lesão corporal etc. Para crimes mais graves, penas mais pesadas.
Evoluíram as sociedades e, em cada momento e contexto histórico, o rigor foi maior ou menor, mas sempre na busca do melhor balanceamento do binômio delito x pena.
Pois bem. Aos juízes cabe a aplicação das leis que definem as punições para cada crime. É da essência do mister e da vida desses operadores do Direito a incessante busca pela solução justa para cada caso.
E, ironia do destino, no caso dos Desembargadores de Mato Grosso, a “pena” para o grave delito de desvio de dinheiro público foi a aposentadoria. Por ora, ao menos – e tudo indica que assim será – não consta que haja processo crime.
Há de se explicar que as punições aos magistrados estão previstas em norma específica, a Lei Complementar nº 35, de 14/03/1979, conhecida como LOMAN (Lei Orgânica da Magistratura Nacional). O artigo 42 da referida lei reza o seguinte: “São penas disciplinares: I - advertência; II - censura; III - remoção compulsória; IV - disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço; V - aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço; VI - demissão.”
E a punição aplicada foi a do inciso V, ou seja, a aposentadoria com vencimentos proporcionais. Pergunta-se: porque é que, ante a gravidade do ato, os Desembargadores não tiveram contra si a pena de demissão? Ocorre que a mesma lei determina, em seu artigo 47, que a pena de demissão será aplicada aos magistrados vitalícios apenas nos casos previstos no art. 26, I e Il. Esse último estabelece o seguinte: “Art. 26 - O magistrado vitalício somente perderá o cargo (vetado): I - em ação penal por crime comum ou de responsabilidade; II - em procedimento administrativo para a perda do cargo nas hipóteses seguintes: a) exercício, ainda que em disponibilidade, de qualquer outra função, salvo um cargo de magistério superior, público ou particular; b) recebimento, a qualquer título e sob qualquer pretexto, de percentagens ou custas nos processos sujeitos a seu despacho e julgamento; c) exercício de atividade politico-partidária.”
Então, não havendo processo-crime e nem sendo o caso de qualquer das outras situações previstas nos incisos do artigo 26, não poderia ser aplicada a pena de demissão.
O que se viu, então, foi que aqueles que devem fazer a justiça ficaram acima dela, sem uma real punição.
Aqui fica a reflexão que deve ser fomentada para que haja avanço na legislação. Cumpre aos diversos setores da sociedade se rebelar contra esse tipo de injustiça, em que uns cidadãos parecem valer mais do que outros.

4 comentários:

  1. Loriane A M Bonadiman5 de março de 2010 às 11:26

    ahuahuahauhauahua
    E eu que trabalhei 25 honestos anos não posso me aposentar porque não tenho 48 anos...
    Isso é um absurdo.Realmente as leis são feitas em benefício de poucas pessoas e funcionam para menos ainda.

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  2. Loriane: os mecanismos de controle social são fundamentais para que as distorções sejam pouco a pouco eliminadas. Esperamos que esse triste exemplo seja o estopim para algumas mudanças.

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  3. Muito bem abordado o assunto, isso demonstra que precisamos ter esse tipo de espaço, parabéns!

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  4. Obrigado, Milena. Continue acompanhando e comentando!

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